Eles só podem limpar as feridas que conseguem ver, mas usam óculos escuros e nossos relógios são de diferentes tempos.
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Meu despertador aguarda o
momento.
Agora.
As luzes do banheiro estão todas
acesas, o que acentua o espelho manchado de dedos e respingos. Há um inseto
esmagado na pia suja de pasta de dentes e a fumaça do cigarro quase no fim
dando voltas no Box verde que minha
mãe odeia tanto. Nunca prestei atenção a essas coisas que
só os que se importam vêem, como os fios de cabelo no chão ou unhas
mal-cortadas.
Minha cueca molhada das poças do
banho de hoje cedo me incomoda. Talvez eu devesse molhá-la de outra coisa pela
última vez, mas não tenho vontade. Acabou o fumo, o filtro queima as pontas do
meu dedo, mas eu não me movo. Daqui a algumas horas eu não sentirei mais nada.
- Cite três fortes razões.
- Diga o nome dos culpados.
- Explique a sua decisão.
- Argumente.
- Pese prós e contras.
- De novo.
- De novo.
- De novo.
A verdade é que se você precisa
se convencer de fazer algo, é porque não quer fazê-lo.
Mas os remédios estão enfileirados, todos cor-de-rosa, não sei quantos, mas muitos, iguais aos da primeira viagem. E a casa está vazia, nenhum grito atrás da porta. Ninguém chamando para o almoço e o telefone está desligado.
Eu esperava fazer isso durante a
madrugada, mas o dia está cinza. Tanto faz.
Eu deveria deixar um bilhete?
Nunca deixei bilhetes.
Agora.
Não há ninguém atrás da porta enquanto a morte te engolfa.